No frio costumo desligar o ar condicionado de manhã. Sei que as ruas nos exigem janelas bem fechadas. Mas no frio, não. Nas manhãs do inverno eu abro a alma, preciso da brisinha do corredor de ar entre as duas janelas. Foi em uma dessas que parei no sinal vermelho, o carro do lado também entregue aos vários ventos.
” E daí que se você não tentar, vai estar sendo covarde. Não tenta porquê? “. Fulana parecia firme, ao que ciclana respondeu ” Não sei”. Eu, mais que intrusa no papo, me recolhi a minha insignificância, não sem antes ter identificado várias situações parecidas. Se fosse eu, naquela conversa, responderia à ciclana, sem hesitar: medo.
Vivemos o tempo em que não se sabe pelas tantas opções: não se sabe porque o descompromissado é aliado, o casual, o descartável, o de bolso. Não se entrega porque talvez o outro seja de joguinhos, nunca se sabe, está cansado do começo, da conquista, das máscaras. Não se tenta, não tem importância, vamos evitar perder o controle, não se quer mais daquelas pessoas que hoje te ama e amanhã não liga. Preguiça, né? Ninguém quer se expor, passar por isso de novo, ser traído novamente, todo mundo cansou de brigar, de dar errado.
Vivemos o tempo de duas ou mais partes com medo. Vivemos a geração de seres que não tem dimensão da morte, e que acham que vão viver para sempre. A geração que está sempre adiando, por medo, sem saber que o fim, ninguém adia. Vamos encarar: somos duráveis. Tem tempo para acabar. Então, ciclana, tá na hora, meu bem. É hora de se preparar, se conhecer, aprender do que gosta e do que não gosta. Time de se impor, de não deixar que certos limites sejam ultrapassados. E depois disso, ou durante o processo, se entrega: você não vai perder o controle se viver um dia de cada vez. Pára de pensar no daqui uma semana, um mês, uma vida. Pare com isso agora. O fim de um relacionamento, de um negócio, de um ciclo, nada disso vai te matar. E se eu te dizer que se der errado, vai continuar tudo certo? Você tentaria?
Não me diga não sei. Vai, tenta. Na pior das hipóteses vai dar errado, nenhuma história é igual a outra, se você está repetindo padrões errados na vida o erro está na energia ansiosa que você emana. A ansiedade muda em você o tipo de comportamento natural que a vida exige da gente. Se recupere disso, não espere presentes da vida, só viva suficientemente bem para amar os dias que você vive, cada pedaço deles. Irradie o tipo de pessoa que você quer do seu lado, deseje estar em paz. Com você, com a vida, com o amor que tem dentro de você. Ciclana, saí lá fora, abrace o mundo, conheça o que te falta.
E agora me perguntam, que foi da ciclana? Não sei. Mas o sinal ficou verde, o carro andou, e tudo foi junto.
* Foto Lisboa, Portugal